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[Notícia] O homem que garimpou mais de 1 milhão de discos de vinil, do site GQ/Globo

Matéria retirada do

http://gq.globo.com/Cultura/noticia/2014/09/historias-do-homem-que-garimpou-mais-de-1-milhao-de-discos-de-vinil.html

As histórias do homem que garimpou mais de 1 milhão de discos de vinil

Manoel Jorge Dias (Foto: Divulgação)

A torto modo, é quase o contrário.

O engenheiro passou mais de uma década comprando velharias. Quadros, livros, compactos e, principalmente, discos de vinil. Juntou mais de 1 milhão de LPs – maior acervo da América Latina, nas contas dele – e decidiu tirá-los do passado e colocá-los de volta no cotidiano das pessoas, sobretudo dos mais jovens. Todo este tempo caçando, comprando e organizando relíquias, mais o ambicioso plano de tornar o bairro paulistano da Mooca (onde fica o seu Casarão do Vinil) na ‘capital Nacional do vinil’, naturalmente lhe rendeu boas histórias. À GQ, ele contou algumas delas.

1. Troco calcinhas por discos
A coleção de vinis começou por causa de um empreendimento fracassado. Em 2000, Manoel comprou um grande lote de roupas femininas, no intuito de abrir uma loja. Não precisou de mais do que um ano para ver que o negócio estava fadado à falência, e em 2001 partiu para o escambo pelas ruas da Mooca. Trocava lingeries e outras peças por livros, móveis, objetos de decoração e… vinis. Por que não, então, aumentar o estoque?

Casarão do Vinil, na Mooca, em São Paulo (Foto: Divulgação)CASARÃO DO VINIL, NA MOOCA, EM SÃO PAULO (FOTO: DIVULGAÇÃO)

2. Terreno vendido para comprar LPs

À procura de discos, o Manézinho encontrou uma oportunidade única. Um dono de lojas no centro da cidade estava vendendo 200 mil discos de vinil para comprar terrenos e expandir o negócio. O engenheiro, por sua vez, tinha imóveis pouco utilizados, que queria se desfazer. O negócio estava feito. Manoel vendeu as propriedades e, com parte do dinheiro, levou todo estoque numa tacada só. “Foram cinco caminhões cheios de LPs trazidos no meio da chuva”, diz ele.

3. Garimpo de vinis como terapia
Montar uma coleção deste tamanho de discos exigiu bastante de Manoel. Foram diversas viagens ao interior de São Paulo e do Rio de Janeiro, para cidades como Peruíbe, Paraty e São José dos Campos. As buscas incluíam encontrar as relíquias, negociar preços baixos por elas, carregá-las para depósitos na Mooca e, ainda, limpá-las e organizá-las. Esta rotina digna de um ‘caçador de relíquias’, desses que se vê na TV fechada, virou uma terapia para o Manézinho.

Em 8 de dezembro de 2001, quando ainda era um novato no mundo dos vinis, Manoel foi sequestrado. O caso foi traumático. Tanto que exatamente um ano depois, em 8 de dezembro de 2002, quando Geraldo Alckmin apertou o botão para iniciar a implosão do Carandiru, o engenheiro brincou com o então novo governador de São Paulo que completava, ali, um ano de vida. “Acumular vinis acabou representando uma terapia para mim naquela época.”

Casa (Foto: Divulgação)CASARÃO DO VINIL, NA MOOCA, EM SÃO PAULO (FOTO: DIVULGAÇÃO)

4. R$ 7 mil por um vinil raro de Roberto Carlos

Manézinho da Implosão tem na ponta da língua qual é o disco preferido dele, ironicamente um dos que hoje está nas mãos de outro: Louco por Você, de Roberto Carlos, lançado em 1961. “Eu tinha o disco que está em melhor estado entre todos os disponíveis no Brasil”, lembra. O LP é valioso porque foi o primeiro da carreira do rei e também porque foi renegado, retirado do mercado depois de vender só 3,5 mil cópias. “Era um disco bom. Ele imitava o João Gilberto, que já fazia muito sucesso na época”, afirma o caçador de vinis.

Bateu à porte de Manoel um homem que queria comprá-lo a todo custo. Que tal R$ 7 mil? Negócio fechado. Era um dinheiro razoável para o padrão de vida do engenheiro. “Eu não queria vender. Me arrependi. Quando ele veio buscar, eu desisti, mas ele disse que eu tinha que cumprir minha palavra, e ele levou. Foi o disco mais emblemático que tive”. Este homem é músico, toca em uma banda famosa, conta ele, e será revelado “no momento certo”.

5. Quem avalia os vinis? Um cego
Engenheiro por formação, reconhecido no mercado por implodir edifícios, Manoel admite que não é nenhum expert no mundo da música. Aprecia boa música, sabe identificar um LP raro, até porque passou incontáveis horas atrás deles, mas preferiu contratar uma equipe para avaliar, organizar e dar preço a tudo o que encontra e compra nas caças a relíquias.

Esta avaliação é feita por quatro pessoas. Primeiro, a que tem menor conhecimento sobre música verifica o disco e lhe dá um preço. O valor é reajustado pelo sujeito a seguir, com mais bagagem cultural do que o primeiro, e depois pelo terceiro. O quarto e último, que tem mais conhecimento entre os quatro, curiosamente, é um cego. Celso Marcílio, dono da loja de música Celsom, no centro de São Paulo, reconhece vários dos álbuns só com o tato.

“O que é legal é que ele não sabe do preço que a pessoa anterior colocou. Ele ouve, vê o valor musical e põe o preço sem ser influenciado pela análise de quem veio antes. Se o disco chega nas mãos dele a R$ 30 e ele diz que vale R$ 50, confio nele e troco o valor”, explica o chefe.

Casarão do Vinil, na Mooca, em São Paulo (Foto: Divulgação)CASARÃO DO VINIL, NA MOOCA, EM SÃO PAULO (FOTO: DIVULGAÇÃO

6. O ambicioso plano da ‘Capital Nacional do Vinil’
É no bairro da Mooca, em São Paulo, que Manézinho mantém a coleção de vinis estocada em galpões e também à venda em três lojas. Uma na Rua da Mooca, 3.401, onde realiza o Feirão do LP desde março deste ano a preços populares, entre R$ 5, R$ 10 e R$ 30. Outra na Rua do Oratório, 273. E, mais recente, uma na Rua dos Trilhos, 1.212, apelidada de Casarão do Vinil. Esta última foi inaugurada no fim de semana passado também com vendas a preços baixos.

O casarão tem 600 metros quadrados, com arquitetura colonial datada da década de 1940 e quase nenhuma restauração. Lustres, cadeiras e mesas lembram a mobília de seus bisavós. As paredes, com antiga pintura cor de rosa, descascam em vários cantos. Foi neste ambiente que dezenas de homens e mulheres de várias idades se encontraram no fim de semana para garimpar LPs – alguns deles, a notar pela agilidade ao passar de disco em disco e pelas luvas e máscaras que os protegiam do pó que subia dos vinis, bastante experientes na atividade.

O Casarão do Vinil faz parte de um plano maior, o de transformar a Mooca na ‘capital nacional do vinil’. Mais para frente, Manoel Jorge quer inaugurar um centro cultural para expor os discos mais valiosos e raros que dispõe e criar um tour no bairro: o público chega de trem, pela estação Bresser/Mooca, e toma um ônibus particular que passa pelas três lojas. “Faremos um roteiro para atender todas as manifestações culturais, todas as tribos”, explica o colecionador. “O vinil nunca acabou, mas agora voltou com tudo também para os jovens.”

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